quarta-feira, 25 de julho de 2018

Eu fui roubado,
mas fui eu quem deu...
Roubo sim,
palavra forte pra um ato
de força igual.

Era invasão,
mas eu cedi
não era a intenção inicial,
mas eu me rendi.

Os dedos me invadiam,
sem querer,
eu a invadi,
causei choque
ela é enxurrada,
eu me molhei,
não era hora.

Eu era verde demais,
ela madura,
era verde demais,
ela veneno.

Doía.

Eu fui embora,
mas não é justo,
ela tá feliz,
e eu julgo culpada.

Engano,
falsidade comigo,
ego consigo...

Futuro fadado ao desespero,
eu amaldiçoei,
nada de amor,
ela vai chorar.

                          Ingrid Nogueira.

Era um pacote duro e frio,
 que estava ali...
Era noite.
E pela manhã, o socorro chegou.
 Mas era tarde já,
Jogado no canto da calçada estava,
 Foi ali que o encontraram..
Coitado corpo,
 Cortado o corpo,
E por toda a noite eu o vi...
Eu o assisti desde o começo,
 Eu testemunhei o início,
E foram dias cheios,
 Dias longos,
Foram quentes os seus dias...
E eu testemunhei o fim também...
Mas ninguém me viu por aí...
 É que quando a gente desgarra do corpo
As pessoas costumam mesmo não ver.
Mas aquela moça me viu,
 Ela me sentiu,
E sentiu, e viu...
 Me deixou mostrá-la o que comigo se passou.
É, eu era o cadáver,
 O corpo morto,
Gélido,
 Frio,
Duro e sem cor...
E antes disso, ela havia me visto,
me deixou me apresentar a ela,
e era a única pessoa que realmente me via,
ela me olhava nos olhos
ela sabia o quanto eu existi...
Foi ela quem me fez realmente existir,
e que me ensinou a não só estar aqui,
e agora eu morri,
e não consigo lhe lembrar os olhos,
sei bem qual é a sensação de tê-los dentro dos meus,
mas não sei mais do formato,
nem da cor...
Mas sei dos dois grandes vazios,
da cavidade que eles formavam dentro dos meus,
pra me entender cada detalhe...

Outra Maria


  Maria,
coitada!

 Coitada da pobre mulher
na qual a Maria se tornou...

A rotina,
 a lembrança,
  a memória...
O corpo reclama.

E a cabeça também!
A cabeça principalmente,
reclama e dói,
todos os dias,
sem intervalos,
e não melhora nem com analgésicos...

 É que a dor na cabeça
é de tanto tentar entender os outros,
que também não a entendiam
 (mas as suas cabeças não doíam)...

 E a Maria não entendia...

 Maria não tem ninguém,
ela não tem nem o amigo
que há alguns dias a vinha visitar...

(A solidão dói!)

 Ele também foi embora,
e ela não entendia o porquê,
e não entendia também porque
todos diziam que ela via coisas.

 Maria o via,
e ele existia.
 Era tão nítido,
porque os outros insistiam em dizer
que ele não existia?

 Maria estava velha,
e sozinha,
não tinha filhos,
e nem amor
Maria não sabia o que queria,
não era nem uma velha ranzinza...

 Maria nunca soube o que fazer,
e nunca soube o que falar,
 Maria emudeceu ao ver que
a vida é grande demais...

 Ela passou a vida inteira
calada, quieta,
o silêncio era quente,
era aconchegante,
era o lugar onde ela se sentia acolhida.

Foi então que o seu amigo veio,
quando Maria abraçou o silêncio,
porque ele também era segredo,
assim como a felicidade,
e a dor...

Maria era fã das coisas secretas,
ela era agora uma mulher dos segredos,
das coisas pagãs,
e místicas,
e reais o bastante para doerem.

Maria via,
e sentia,
e sofria,
mas caladinha,
nos sonhos...

Maria não queria que fossem sonhos
e ela não chorava.

Estagnada,
era como ela definia
uma pessoa que não sabia ficar em silêncio,
Maria matava as pessoas que eram estagnadas,
não na sua cabeça,
Maria andava um tanto assassina

Então foi internada,
e morou no silêncio
até não mais morar.

Ingrid Nogueira.

terça-feira, 24 de julho de 2018

Nada anda funcionando,
eu ando em estado não sóbrio,
mas também não ébrio.

Minha ressaca anda doendo,
anda sendo do cansaço,
do trabalho, da leitura,
da falta de tempo,
e do excesso de pensar.

A ressaca anda vindo
de dentro de mim,
sem precisar colocar
química nenhuma,
não há descanso,
eu ando não produzindo.

E ando angustiada,
fria, ferida.

Meus becos andam molhados,
chuva artificial,
meus mares andam secos,
solos rachados.

Nada tem sido
verdadeiramente fértil,
nem a mente.

Eu ando me apaixonando,
e é platônico,
eu não devia me apaixonar,
ela me avisou do risco,
mas não havia nada mais a fazer,
a não ser o me afastar,
ou o fingir.

Escolhi o mais difícil,
porque eu não me deixaria
voltar ao ponto onde
você não me via.

Então decidi morrer
a dor,
mesmo que profunda,
ainda foi mais curta.

Eu sou inútil
mas ela diz que não,
e eu não acredito.

É como eu me sinto.

Não quero que ela amenize
a minha solidão,
nem a podridão,
e menos ainda a inutilidade.

Sinto que preciso escrever
mas não sei o que colocar aqui.

Perdi a intimidade com as palavras.

Ou seria com os sentimentos?

Os sentires não me encontram mais.

Tem gente brava comigo,
o meu coração arrepia de saber.

Tem energia acumulada
e o peito dói,
não tem mais incenso,
nem o cigarro disfarça.

Choro.

Chóro!

Vem ali o desespero,
e eu me desespero,
eu me proponho,
mas uso máscaras,
o peito ainda dói.

A morte não me rodeia,
e ainda assim,
também não a vida.

Eu tiro a morte pra dançar,
e a vida inveja...

Eu não quero laços que me deixem dívidas,
eu quero relações estreitas,
e firmes,
e nada mais firme que
a relação com La Muerte...

Nada mais atraente e perigoso,
a vida tem um cheiro enjoado,
um cheiro triste,
um ar denso...

E eu não gosto desse ar frio...

            Ingrid Nogueira.

Hoje eu me senti a pior pessoa do mundo,
eu penso coisas que me fazem ter nojo e medo de mim.

Hoje eu fui tomar banho,
e coloquei o chuveiro no máximo,
a intenção era  mesmo derreter,
o calor me machucava a pele,
mas nada de desaparecer.

Os meus pensamentos andam mais imundos
do que qualquer das vezes nas quais
eu me sentei frente a esse mesmo computador,
eu me toquei que cada vez que
eu me sento aqui,
eu estou um tanto mais suja.

E que os intervalos entre essas vezes
são cada vez maiores,
então talvez esteja aí a resposta...

Ou eu ando mais feliz,
ou ando cada dia fingindo mais.

O que não quer dizer que eu
finja melhor hoje do que nas vezes anteriores.

Tenho andado distraída,
mais do que nos outros dias,
mais até do que em outras vidas.

E já entendi porque ando voltando,
o motivo de ainda renascer aqui...

É que eu peco por antecipação,
peco por urgência,
e peco por dor...

Eu sei que é inconsciente,
mas eu me culpo,
tem doído,
e sigo chorando,
mas mainha me diz sempre p'rêu voltar...

Eu não posso trilhar outro caminho
enquanto não aprender,
mas a lição dói,
é difícil,
agora eu lembro da dor
e lembro da sensação...

É que em outra vida eu fui até o fim,
a cabeça dói sabia?
O pulso, a veia, o pulmão,
a pupila te deixa cego,
deve ser pra não ver a despedida,
deve ser pra não enxergar o rosto
da sua mãe mais essa vez...

Não tem frio não,
isso é mentira,
mas tem o vazio,
tem o choro,
tem a angústia...

E eu não quero mais essa chance,
mas parece que alguém lá da diretoria não entende...

Eu não quero voltar,
não tem nada de novo aqui,
tenho os surtos,
tenho os desapontamentos,
tenho os amores,
e deles as tristezas, as traições,
os enganos...

O amor é frio,
não é nada bonito,
eu lembrei que vim buscar companheirismo,
mas tem muita gente aqui,
e isso me assusta,
gente é ameaça,
eu quero é minha companheira.

E quero que ela me queira,
meu peito anda cansado,
meu cérebro sem oxigenação,
eu ando mirrada,
eu ando não sendo minha companheira,
eu ando me machucando,
e me abandonando,
e dando o mesmo direito,
eu ando me enganando,
e que direito eu penso que tenho
de exigir que não me façam o mesmo?

Eu me deixo doer,
melhor ainda:
eu me faço doer,
eu sou dor e tristeza,
eu ando mirrada,
triste, feia, murcha...

E a poesia voltou a se alimentar de mim,
de todos os meus podres,
de todos os meus galhos mortos,
de todos os meus frutos podres,
depois dos azedos,
da minha folhagem, do meu corpo
e das minhas raízes,
eu desisti.

Mas como a uma semente,
ela me faz brotar,
mas eu não quero mais voltar...

Prendi o ar.

                    Ingrid Nogueira.